Uma princesinha resplandecente e bem
educada. Havia nascido para ser a menina joia da família preciosa. Em sua débil
constituição social, aos poucos, depois de alguns anos desse insistente cárcere
moral, Marguerite havia se transformado na prostituta mais famosa da cidade.
Sua família não entendia o que havia acontecido de errado. Cada um dos mil
semblantes que haviam lhe visitado cuspiam um trocado promíscuo de algumas
moedinhas no baú de seu interior húmido e fértil. Era uma putinha refinada
porém barata. Fazia questão de não cobrar muito para não descriminar as diversas
classes de sua deliciosa perdição. Ao mesmo tempo, não recusava pequenos incentivos
vindos como vultuosas nunca desinteressadas doações. Depois de
algum tempo, havia acumulado uma pequena fama e fortuna. Poderia partir com o
sorriso estampado no clitóris. Sua mãe descabelava-se sempre ao visitar as
páginas da internet para espiar seus
provocantes delitos. Fingia que nada
sabia. Era uma mulher religiosa e assexuada. Essas que apagam o fogo das entranhas
com a delicada imagem da santa. Ironia amarga da vida. Mal sabia ela que o fetiche
de Marguerite era penetrar-se com a virgem casta do seu altar. Sim, ela
masturbava-se com a virgem Maria, ao mesmo tempo que era penetrada por uma fila
de homens da degenerada cena burguesa do covil metropolitano social. Não haviam
sobrado muitos. A família nunca sagrada jamais poderia compreender. Um anseio
de liberdade oposto aos triviais e deformados valores de uma personagem
emoldurada na frieza hipócrita das volúveis convenções dos talheres de três
dentes e engomados colarinhos de vidro. Ela debatia-se feito uma cadela no cio
ao mesmo tempo que alimentava a sádica ilusão de menina frágil. Era mais fácil
para seus algozes enxergarem Marguerite como uma pobre coitada. E ela vestia a
carapuça direitinho, amordaçada em sua bela cama das camélias... das
margaridas, das violetas, das rosas defloradas... os copos transbordando de leite! E ria.... ria em orgasmos
múltiplos e sucessivos. Ali todas as flores eram germinadas em sua delinquente e juvenil corola sexual. Quanto mais impingiam um controle, mais ela degenerava-se. O
melhor era saber que existia um lugar que eles jamais iriam tocar. O seu
mundo interior, onde a pequena Marguerite deleitava-se com suas perversões
infindáveis. Um sorriso que eles nunca conseguiriam castrar. Um sorriso que
eles nunca conseguiram compreender! Com o tempo esse ciclo vicioso de ácidos desejos escancarados era tudo que havia sobrado no cotidiano da rotina esvaziada. A puta
virgem da família de um pobre mundo casto estava sufocada pelo tédio. Nada
mais. Marguerite ainda ria, pois conseguia raspar do útero cinza autênticas gotas de
felicidade colorida. Por dentro gozava
enquanto se fingia de morta. Estava acostumada a agir assim. Afinal, havia sido
educada pelo sadismo velado da chama de uma vela de sete dias. Grossa e
redonda. A medida certa para estimular sua prece genital. Sabia que o mundo era
podre por dentro, mas tinha um sabor irreversível de fruta vermelha do pecado.
Um belo dia, Marguerite partiu. Tinha cansado de ser uma puta rica e ociosa,
vestindo o mal hábito de uma freira amarela e comportada. Ela havia decidido
recomeçar. Iria sublimar essa chama ilibada do maçarico ereto das santas
torturas religiosas e transformar sua perdição em um novo destino. Almas livres rodopiando nas fogueiras eternas
das mentirosas saudades. A carne finalmente havia se tornando imunda, porém o espírito
ficou mais leve. Prostituição no ofício
do prazer. Dona de sua própria vagina, Marguerite no clamor de uma vida sempre
surpreendente, no outro lado do mundo, apaixonou-se por um estudante de
direito. Amarga ironia. Morreu vítima de Aids. Uns dizem que foi a conjuntura dos fatos que a debilitou. Ela foi
humilhada pelo pai do rapaz. Seu futuro sogro tinha sido um dos muitos
frequentadores de seu inflamado apartamento. Quem diria!... do outro lado do
mundo encontrou o amor na prole de um antigo cliente. A pretensiosa regenerada e a
verdade atirada na cara do próprio filho. O pai jamais pôde admitir tal
união. Era um dia cinza e chuvoso quando a vela se apagou. Diante de sua
penumbra num quarto no terceiro andar, a imagem perdida da santa. Antes de
morrer, Marguerite no seu mais profundo ser, deu um leve sorriso repuxado,
lembrou-se de quando era menina, e com a textura viril das juntas de seus dedos
longos, acariciou-se até o último suspiro enquanto falava com a mãe no
telefone... “mãezinha, saudades de você... não se preocupe, está tudo bem
comigo, fique em paz...Adeus!” Um dia ainda seria canonizada... mas muito, muito tempo depois de deixar essa incompreensível lembrança imaculada e pura, radiografada na indelével mancha para sempre livre na branquidão imensa do lençol.
A sempre vibrante curiosidade ao profano, a promiscuidade... paradoxal!!!👍🏻👍🏻
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